quarta-feira, 25 de maio de 2011

TERTÚLIA NATIVA - ERAM OS DEUSES DESEMBARGADORES?

Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância.

Amigas e Amigos,

                O escritor suíço Erich von Däniken, em livro de 1968, perguntava se “Eram os Deuses Astronautas?” para tentar justificar a inteligência de antigas civilizações. Supondo uma resposta negativa para a questão proposta pelo escritor, pode-se perguntar se seriam desembargadores?

                O dicionário Aulete diz ser desembargador o “juiz de Tribunal de Justiça ou de Tribunal de Apelação, cuja função é suspender o embargo de alguma coisa”. Conforme o dicionário, embargo é o “instituto jurídico que trata de impedir a conquista de algum direito”.

                Ex positis (Isto posto) – como algum jurisconsulto latinado poderia utilizar com muito mais propriedade do que eu –, comento outra “ex”, que se tornara um embargo na vida de um desembargador em Minas Gerais e que foi de maneira criativa desembargada pelo próprio desembargador, talvez em conluio com alguns parceiros. Matéria do jornal Estado de Minas (www.em.com.br), publicada hoje, diz que:
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instaurou procedimento disciplinar para apurar a nomeação, pelo desembargador de Minas Elpídio Donizetti – diretor da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamagis) –, de sua ex-mulher, servidora do Tribunal de Justiça, para um cargo de assessora, em troca do pagamento da pensão alimentícia. [...] e acordo com os documentos, o desembargador atirou no próprio pé ao tentar fazer sua defesa. A representação contra o magistrado foi feita pelo Sindicato dos Servidores do Tribunal de Justiça, em razão da prática de nepotismo. Para afastar a acusação, Donizetti informou que não estava mais casado com a servidora, portanto, não havia favorecimento de parentes. Para a comprovação, o CNJ solicitou a documentação referente à separação do casal. A surpresa veio na análise pelo CNJ no termo de acordo de separação homologado pelos dois. Nele, fica claro que o cargo comissionado entrou na barganha, já que Elpídio Donizetti ficaria isento do pagamento de ajuda financeira enquanto a ex-mulher ocupasse o cobiçado cargo de assessor no Judiciário. [...] O desembargador confirmou também que nomeou a ex-mulher para seu gabinete, no fim do ano passado, mas não viu impedimento nisso, já que estavam separadas. “Minha mulher é uma pessoa altamente qualificada e seria nomeada por qualquer desembargador que tivesse uma vaga em razão de seu currículo. Acontece que me dispus a fazê-lo”, diz. Ele explicou ainda que, em outubro do ano passado, a ex-companheira trabalhava para um desembargador que morreu e, portanto, ele viu aí a oportunidade de ter uma funcionária qualificada. “Me surpreendeu essa interpretação do CNJ do meu acordo, mas com a instauração do processo disciplinar vou ter oportunidade de provar que não agi de má-fé. Não tenho vergonha de minha vida”, conclui. [...] Essa não é a primeira vez que o desembargador sai em defesa de parentes no serviço público. Em 2005, quando presidia a Anamagis, Donizetti propôs ação direta de inconstitucionalidade (Adin) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Resolução 7 do CNJ, que proíbe o nepotismo (emprego de parentes) no Judiciário.

                Nós, sem alcançarmos a “justiça” dessas divindades desembargatórias, ficamos sem entender porque os “pobres mortais” são obrigados a ajudar esses deuses – com impostos cada vez mais vorazes – a pagar suas pensões. Como estamos diante de uma situação em que a pensão é paga por meio de arrecadação de dinheiro público, daqui a pouco poderemos ser condenados – como contribuintes – pela interrupção do pagamento do salário-pensão da “ex” do “justo” desembargador.



                Como o desembargador de Minas, quem também não tinha vergonha da própria vida era “tio Afonso”, personagem de um causo do livro “Na sombra da Figueira Grande” (Martins Livreiro Editor, 1994), de Luiz Gonzaga Soares do Nascimento, que transcrevo abaixo.

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O PALA
                                                            Luiz Gonzaga Soares do Nascimento

                Em Tupanciretã, ao tempo deste causo, o comerciante mais forte, mais conhecido e, creio, de maior freguesia, era o senhor Orlando Becker. Dele, quase em geral, se sortiam os fazendeiros da região.


                Meu avô, freguês e amigo particular do comerciante, mandava suas carretas de carga com antecedência para efetuar seu sortimento de sal, farinha, açúcar e outros gêneros e miudezas indispensáveis para quem vive na campanha. No dia do carregamento ele chegava em seu carro (espécie de diligência ou cabriolé) ou a cavalo. Ultimava as compras, providenciava a arrumação das mercadorias nas carretas e pagava o comerciante – Essa era a praxe.

                De uma feita, numa dessas jornadas às compras, o tio Afonso pegou carona.

                Enquanto minha avó comprava miudezas e meu avô chimarreava aguardando o momento da partida, o tio Afonso manuseava e admirava, deslumbrado, um vistoso pala de lã.
Como bom vendeiro, o dono da loja aproximou-se do tio Afonso e perguntou-lhe:

                – Gostou do pala, seu Afonso?

                – Sim, muito. – respondeu o velhote.

                – Pois, então, experimente-o e, se lhe servir, leve-o.

                – Não, não posso, estou sem prata!

                – Ora... Ora, o irmão do coronel Aníbal tem carta branca na minha loja! Leve-o e me pague quando quiser, quando puder!

                Sempre sorrindo e olhando para o lojista, o pícaro tio Afonso, por certo já de plano traçado, convenceu-se de imediato.

                – Se é assim... Para pagar quando quiser ou quando puder... Eu levo!

                Muito tempo depois, como várias vezes o tio Afonso já tivesse voltado na loja e nunca fizesse menção sobre a aquisição efetuada a crédito, o comerciante resolveu rememorar-lhe:

                – Seu Afonso... E o pala?

                – Ah!... O pala... Muito bom, excelente, seu Orlando!

                – Não é bem isso, seu Afonso... O que me interessa mesmo, é saber quando é que o senhor vai me pagar?

                Aparentando espanto e surpresa, de olhos muito abertos, o tio Afonso inocentemente indagou:

                – Mas, seu Orlando, eu estou pelo nosso trato... O senhor não me propôs de que eu pagasse quando quisesse ou quando pudesse???

                – Sim, e daí?...

                – Daí que hoje eu queria lhe pagar, mas não tenho dinheiro; portanto, não posso faze-lo. Dias atrás, eu tinha uns trocados, podia pagar-lhe, mas não quis faze-lo. Enfim... Como estamos tratados, vamos ficar pelo nosso trato!

                E dessa forma, o tio Afonso jamais pagou o pala tão gentilmente vendido. Tendo descoberto a capetagem do irmão, meu avô terminou com a estória pagando para o comerciante a mercadoria em questão.

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                Depois das "sem-vergonhices" apresentadas, a música de hoje é a toada de lamento “Justiça Social”, de Téo Azevedo e Valente, na interpretação do próprio Téo Azevedo, violeiro, compositor, cantador e folclorista de Alto Belo, norte de Minas Gerais, próximo ao Vale do Jequitinhonha.



                Enquanto a letra da música retrata a realidade cheia de indecisões, a justiça para o desembargador também poderá ser “duríssima”: ele será absolvido, continuará trabalhando – pois foi entendido que não há do que se envergonhar mesmo – e recebendo seu bem remunerado salário (pago pelos contribuintes) ou ele será condenado, afastado de suas funções, aposentado precocemente e continuará recebendo seu bem remunerado salário (pago pelos contribuintes).

                Até o próximo e um grande abraço!

Wilmar Machado

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