sexta-feira, 4 de maio de 2012

GALERIA SERTANEJA – ACABOU-SE O SOM DA VIOLA



Um artista é um sonhador que consente em sonhar o mundo real.
(Jorge Santayana)




Amigas e Amigos,

Na madrugada de hoje, 4/05, aos 91 anos, morreu José Perez, o Tinoco da dupla de irmãos Tonico & Tinoco, cuja trajetória profissional começou em 1935 com nome artístico de “Trio da Roça” (com a participação de um primo), fazendo show na Festa de Aparecida de São Miguel. No final dos anos 30, passaram a se apresentar na Rádio Clube, de São Manuel-SP.

No início dos anos 40, passaram a ser conhecidos como “Irmãos Perez”, contratados pela Rádio Difusora (depois Tupi FM) para participar do programa “Arraial da Curva Torta”, apresentado pelo Capitão Furtado, que durante um ensaio do programa disse que a dupla não combinava com aquele nome espanhol e os batizou como Tonico & Tinoco. A partir daí, escreveram juntos uma história de muito sucesso, com a gravação do primeiro disco em 1944, com apenas uma música.




Já em 1946, alcançaram o sucesso com a música “Chico Mineiro”, que consta no disco como de autoria de Tonico e Francisco Ribeiro. Essa música consagrou a dupla como a mais famosa do Brasil, tornando, mais tarde, os irmãos Perez apresentadores do programa “Na Beira da Tuia”, da Rádio Bandeirantes, até o início dos anos 80, quando migraram para a televisão, com programa com o mesmo nome na Band.

Ao longo dessa belíssima carreira artística – interrompida bruscamente em 1994 com a morte de João Salvador Perez, o Tonico, que caiu de uma escada no prédio onde residia –, a dupla vendeu mais de 150 milhões de cópias de seus mais de 80 discos, e realizaram cerca de 40 mil apresentações.

Essa homenagem a Tinoco se vale da música “Chico Mineiro”, cuja letra e interpretação seguem abaixo. Tonico, conforme citado acima fez essa música em parceria com Francisco Ribeiro. E para conhecer um pouco mais desse parceiro de Tonico, encontrei no blog “Música & Poesia” (http://musicpoesia.blogspot.com.br), uma postagem de janeiro de 2008, citando um relato de Tinoco, com o seguinte teor:
Em Julho de 1946, quando o Tonico e eu chegávamos para fazer o Programa na Rádio Difusora de São Paulo, fomos chamados pelo porteiro da emissora, o senhor Francisco Ribeiro, que contou-nos uma história de dois irmãos. Um saiu pelo mundo e virou peão (Chico), o segundo (Zé Mendes) tornou-se dono de tropa. Quis o destino que se encontrassem. Pôr muitos anos trabalharam juntos, e só com a morte do Chico é que veio a revelação do parentesco entre eles. Na década de 90, fui (Tinoco) até Goiás Velho (Antiga Capital de Goiás), onde existia na época alguns pertences, uma capela e a lenda do Chico Mineiro que vivia na lembrança de muitos moradores. Outro detalhe que não está revelado na letra, é que Chico (O mais velho), sabia que era irmão de Zé Mendes (O mais novo) e sempre procurou defende-lo em muitas dificuldades. Escrevemos a história numa folha de pão (que existia nas padarias), e virou um dos maiores sucessos de Tonico e Tinoco.

         Juntos novamente, Tonico & Tinoco devem estar começando nova carreira artística na eternidade, ainda mais marcante do que a conhecida por toda a obra que nos deixaram. E não deverá faltar, lá também, pedidos para que toquem novamente “Chico Mineiro”, cuja letra está a seguir.

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CHICO MINEIRO
                                  Tonico e Francisco Ribeiro

Cada vez que me alembro
Do amigo Chico Mineiro,
Das viage que nois fazia
Era ele meu companheiro.
Sinto uma tristeza,
Uma vontade de chorar,
Alembrando daqueles tempos
Que não mais 
hai de voltar.
Apesar de ser patrão,
Eu tinha no coração
O amigo Chico Mineiro,
Caboclo bom decidido,
Na viola era delorido
E era o peão dos boiadeiro.
Hoje, porém, com tristeza,
Recordando das proeza
Da nossa viagem e motins,
Viajemo mais de dez anos,
Vendendo boiada e comprando
Por esse rincão sem-fim
Caboco de nada temia.
Mas porém, chegou o dia
Que Chico apartou-se de mim.

Fizemos a última viagem
Foi lá pro sertão de Goiás
Fui eu e o Chico Mineiro
Também foi o capataz.

Viajemos muitos dias
Pra chegar em Ouro Fino
Aonde passamos a noite
Numa festa do Divino.

A festa estava tão boa,
Mas antes não tivesse ido
O Chico foi baleado
Por um homem desconhecido.

Larguei de comprar boiada
Mataram meu companheiro
Acabou-se o som da viola
Acabou-se o Chico Mineiro.

Depois daquela tragédia
Fiquei mais aborrecido
Não sabia da nossa amizade
Porque nos dois era unido.

Quando vi seu documento
Me cortou o coração
Vi saber que o Chico Mineiro
Era meu legítimo irmão.


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         Na saudosa Galeria Sertaneja de hoje, a interpretação de “Chico Mineiro” é com a dupla que lançou essa música: os eternos Tonico & Tinoco.



         Um grande abraço e até a próxima!

quinta-feira, 3 de maio de 2012

TERTÚLIA NATIVA – DOUTOR EM DISCRIMINAÇÃO


O falhado é um homem que errou
mas não é capaz de converter o seu erro em experiência.
(Elbert Hubbard)



Amigas e Amigos,

         Um shopping em Brasília-DF foi palco de uma ocorrência no último domingo, 29/04, que, pelas informações disponíveis até agora, somente provocou todo o constrangimento noticiado pela impunidade que beneficia os delinqüentes nessas Terras de Santa Cruz. Um médico, identificado como Heverton Octacílio de Campos Menezes, de 62 anos, teria ofendido uma funcionária da bilheteria da área de cinemas do shopping por que ela não foi conivente com a intenção dele de “furar a fila”.

         A funcionária da bilheteria, falando para diversos meios de comunicação, informou que o médico teria dito que  ela “era muito grossa que era por isso que tinha essa cor, que estava no lugar errado, que ali não era seu lugar, que não devia estar lidando com gente, devia estar lidando com animal. E disse também que não deveria estar morando aqui que deveria estar morando na África, cuidando de orangotangos”.



         As câmeras de segurança do shopping mostram o referido médico saindo do cinema e descendo as escadas rolantes como se fugisse de algo. Existem relatos publicados de que a forma ostensiva com que o médico agrediu a funcionária acabou provocando uma reação contrária entre as pessoas que aguardavam na fila – as que o médico queria “passar para trás” –  e que solicitaram mais respeito por parte do  descontrolado cidadão.

         Hoje, lendo a edição impressa do Correio Braziliense, encontrei uma entrevista do medico Campos Menezes, em que ele nega todas as acusações de discriminação racial contra a funcionária da bilheteria, Marina Serafim dos Reis, de 25 anos, dizendo ainda que em nenhum momento insultou a atendente. Segundo o Correio, o médico alegou:
ter dito apenas que ela estava sendo “descortês”. “Não entendo por que a palavra ‘descortês’ causou tanto mal entendido”. Questionado pelo Correio por qual motivo então teria fugido correndo, já que as imagens feitas pelo circuito de câmeras do shopping mostravam claramente isso, ele respondeu que, por conta do nervosismo da funcionária, as pessoas que estavam na fila ficaram muito exaltadas e ficou com medo de um linchamento. “No Brasil é muito comum as pessoas, a polícia, matarem ou baterem. Quis apenas preservar a minha integridade física”, disse.

         Fico pensando que, mesmo para um grande mestre do surrealismo, seria muito difícil pintar um “quadro” melhor do que a alegação publicada pelo jornal. O “equilibrado” médico da alegação acima, ainda conforme o Correio, “acumula, em 18 anos, outras nove acusações na Polícia Civil do Distrito Federal. Entre as queixas estão injúria discriminatória, desacato, agressão e lesão corporal”.
        
         Em não havendo exagero nas informações publicadas, talvez você também esteja com a mesma dúvida que me assola: como que um indivíduo descontrolado como esse ainda não foi julgado por tantos descalabros?

         E tem mais uma informação preocupante, publicada ontem no portal G1, informando que Campos Menezes:
atuava como psicanalista, em uma clínica no Lago Sul, área nobre de Brasília, mas, segundo a Sociedade de Psicanálise de Brasília, ele não tem formação na área. Segundo um representante do grupo, ele passou por três entrevistas e pelo exame de currículo, mas foi reprovado. Ele resolveu então criar uma entidade, a Associação da Refundação Psicanalítica Internacional, onde dava aulas.


Com todas essas versões para uma mesma história – onde, aparentemente, a única coisa certa é a presença da arrogância e sua consequência primeira, caracterizada pela sensação de superioridade em relação aos demais – lembrei de uma história do livro “Contando Causos”, do múltiplo artista Rolando Boldrin sobre uma versão carregada de fantasia para uma história de caçador.

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O MEDO DA ONÇA
                           Rolando Boldrin



Dentre todos os mentirosos que eu conheci, o mais engraçado deles era o Zé Farol. Esse tinha um jeito especial de inventar suas histórias incríveis.

Como todo mentiroso, causo de onça era o que não faltava ao Zé Farol. Tinha um punhado de mentira, cada uma melhor do que a outra.

Nesse causo que passo a contar agora, ao contrário de todo mentiroso que começa contando vantagem, ele começou contando pra gente assim:

Zé Farol – Óia, gente. Esta que eu vou contar agora foi fogo, porque eu sempre tive muito medo de onça. E num é que  justamente uma das grandes foi a que apareceu um dia que eu fui caçá? Apois bem: quando eu vi a marvada, carpi os pé. Larguei espingarda, larguei tudo ali mêmo e saí desembestado mata afora.

Ouvinte 1 – E daí, Zé? Conseguiu se livrar da onça? 

Zé Farol – Que nada. Pois num é que a mardita garrô corrê atráis de mim feito uma doida. E eu lá no meio daquele mato... correndo. E a onça atráis pega num pega... tava chegando nos meu carcanhá.

Ouvinte 2 – Conta logo, Zé! Quero vê como ocê se livrô dessa bitela... 

Zé Farol – Carma, gente. Eu chego lá. Pois bem, corre que corre, a onça quase me arcançando... De repente, eu trupiquei nuns graveto e tium... Caí de boca no chão. Daí, eu desesperado me virei de barriga pra riba, pra móde num morrê cumo um covarde de bruço pro chão. A onça veio vindo... vindo... me oiando... me oiando... e quando chegou pertinho de mim, que tremia... ela ponhô a pata direita em riba do meu peito... abriu aquele bocão bem na minha cara e roncô bem arto... ansim: GREEEEEEEEEEEE (Zé imitando a onça). O barulho do ronco bravo dela acho que dava para ouvi no arraia.

Todos (muito interessados) – E daí, Zé? O que que ocê fez?

Zé Farol – Me borrei tudo. Me sujei na carça. 

Ouvinte 1 – Pois agora gostei de vê, Zé. Agora ocê provou que num mente. Pois, com uma onça dessas com a pata no meu peito, até eu borrava. Me sujava as carça também.

Zé Farol (calmo) – Não gente. Eu tô falando que me borrei, mas foi agora que eu imitei o ronco arto da onça: GREEEEEEEEEEEEEEEEE...


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         A música para esta Tertúlia traz uma história de um doutor que também deixou o título "subir à cabeça". Escrita por Edward de Marchi e interpretada pela dupla Biá & Dino Franco, pode-se ouvir, abaixo, "Lição de Moral".   





Um grande abraço e até a próxima!