O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal,
mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.
(Albert Einstein)
Amigas e Amigos,
A Tertúlia Nativa desta semana começa com o anúncio institucional do Sindcombustíveis (Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis Automotivos e de Lubrificantes), do Distrito Federal.
O referido sindicato, amparado em uma luta que pretensamente travam há muitos anos contra combustíveis caríssimos, transfere todo o ônus do preço exorbitante praticado pelos postos na venda de combustíveis para distribuidora (preço de compra do combustível) e governo (impostos). Em um trecho da campanha – encarecidamente peço que você não chore de forma compulsiva se ficar comovido com o texto – aparece que:
Preços iguais não significam ‘manipulação de mercado’, cartelização, como acusam esses desavisados de plantão. É natural que num mercado com produtos de qualidade, como os que são oferecidos no DF, o consumidor venha a optar pelo menor preço, provocando na concorrência, a equiparação com seus vizinhos para manter vivo o seu negócio, criando-se um paralelismo de preços. Isso ocorre em todo o Brasil. Perguntamos: Você faria diferente?
Não consegui descobrir ao longo do texto da campanha quem seriam os “desavisados de plantão” que são capazes de chamar esse cartel de... cartel. Também não consegui entender bem para quem é dirigida a pergunta ao final do texto acima, após a fantasiosa explanação. Como penso que a resposta esperada seja “claro que não”, acredito que ela seja para qualquer um que acredite ser impossível conciliar comércio e ética.
Matéria da Agência Brasil (http://agenciabrasil.ebc.com.br), do último dia 9, comenta a participação do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, na manhã daquele dia, em sessão solene da Câmara, com o seguinte trecho:
Lobão reforçou que a Agência Nacional de Petróleo (ANP) passará a ter a responsabilidade de cuidar, também, do etanol. E admitiu que em alguns estados há cartel nos postos de gasolina. “Nitidamente está havendo cartel. Pedi que a ANP fosse ao Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] para que esse descalabro fosse resolvido”, afirmou. O ministro disse que, a partir de agora, as punições para os donos de postos que formam cartéis na cobrança dos combustíveis serão rigorosas. Pode haver cobrança de multa e até o fechamento do posto.
Com a versão das partes envolvidas, onde a troca de acusações transforma o oponente em grande vilão, lembrei que, ontem, em um programa matinal na Band News FM, em Brasília, onde a apresentadora leu um e-mail de um ouvinte, cujo teor abordava a culpa dos preços altíssimos praticados para combustíveis. Escreveu o ouvinte que enquanto o governo diz que a culpa é dos postos e os postos dizem que a culpa é do governo, a única certeza que ele tinha é de que os dois estavam certos.
Falando em combustível, lembrei de um causo sobre um motorista muito rápido, narrado por Apparício Silva Rillo, em seu livro “Rapa de Tacho 3” (p. 61-62), da “Tchê! Editora Ltda.”. Percebam a situação delicada do coitado do motorista.
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O TÁXI VOADOR
Apparício Silva Rillo
Cidão Dorneles, quando capataz do coronel Diógenes Silva, de São Borja, teve necessidade de – pela primeira vez – ir a Porto Alegre. A mulher estava atempada, feiota de saúde e, para seu caso, a solução estava mesmo na capital.
Durante uma semana, no galpão da Fazenda da Tuna, o assunto central das charlas e contracharlas era a viagem do Cidão. Um tanto ingênuo nos seus quase dois metros, braços longos e fortes como varejões de mangueira, Cidão escutava os comentários. E, sobretudo, as recomendações.
– Óia, Cidão, tu chegando da Ferroviária pega um táchi. Dá pro home o endereço que o coronel botou aí nesse papel que ele te leva direto como goela de sapo.
– Mas tem uma cois, índio velho. Te agarra bem no tal de táchi porque os home de Porto Alegre são uns louco na rua. Tem uns que chegam a avoar.
E por aí seguiam as recomendações – Põe teu dinheiro no cano da bota. – Vai armado mas esconde os ferro, que a Brigada tá de ôio na gente. – Não compra bilhete nem do bispo, que te aplicam o causo do bilhete premiado. – E óia os táchi, tem uns que avoam como urubu com um tição no rabo...
De tudo, o que mais impressionou o Cidão foi a história do “táchi” tomar tal velocidade ao ponto de “aovar”. “Avoa, cai, me esculhamba a muié velha, que já tá mais engrupida que arma que matou corvo.” Com a cuca fervendo de conselhos, lá se foi o Cidão pelo trem, coma a mulher e a trouxa de roupas. E uma galinha com farofa e um pão de forno numa lata bem tampada de azeite correntino.
Na manhã do outro dia o trem bufou como touro tesudo na estação central, em Porto Alegre. Meio perdido naquele burburinho, Cidão encontrou a saída. E a uma voz de “Táxi” levantou as orelhas. – Quero um, seu!
Com o bilhete onde estava anotado o endereço, lá se foi o motorista com o casal no banco de trás. A certa altura, indagou:
– É mesmo na João Pessoa, não?
– Se tá no bilhete é justo nesta casa...
O “táchi” tomou velocidade e o Cidão começou a suar. Lá pelas cansadas o motorista, para colocar o passageiro mais a vontade, veio com a nova pergunta:
– É na João Pessoa, sim, aqui está. Mas em que altura?
Na voz de “em que altura” o Cidão saltou de dentro das botas. Arrancou da cintura a “solingen mata-leitão” e berrou para o motorista que quase se borra de susto:
– Tu levanta meio metro este teu “táchi” e eu te tiro a buchada pela cova das ventas!
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Para acompanhar o causo desta Tertúlia, a música escolhida é “Motorista do Brasil”, de Lourival dos Santos e Tião Carreiro, interpretada pela dupla Tião Carreiro e Pardinho.
Para terminar, um grande abraço para todos e até a próxima,
Wilmar Machado