sexta-feira, 30 de março de 2012

FOGÃO DE LENHA – CHARQUE ACEBOLADO E SENADOR ESCALDADO



Um dos maiores travões aos delitos não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade (...)
A certeza de um castigo, mesmo moderado, causará sempre impressão mais intensa
 que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade.
(Cesare Beccaria)



Amigas e Amigos,

         O senador Demóstenes Torres, que já atuou como promotor de justiça e secretário de segurança em Goiás, há muitos anos desempenha o - talvez para ele difícil - papel de guardião da ética política (?) e forte opositor do governo. Pois no início deste mês de março, caiu a máscara de bom moço (nem tão moço) com o aparecimento de denúncias sobre o envolvimento do senador com o bicheiro Carlinhos "Cachoeira". 


          E parece que a cachoeira é bem maior do que as evidências surgidas recentemente. Essa águas estão rolando desde, pelo menos, 2006 quando, segundo notícias que tentam abafar, a Polícia Federal já teria colhido evidências de que Demóstenes estaria envolvido com o esquema de jogo de bicho em Goiás, beneficiado com alto faturamento. Dizem, ainda, que quando tomou conhecimento das denúncias, o senador teria "comprado" até delegado da PF. 

           Na página de Notícias do UOL,  em 29/03, foi noticiado que:
O STF (Supremo Tribunal Federal) abriu nesta quinta-feira (29) um inquérito para investigar elos entre o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) e o empresário do jogo do bicho conhecido como Carlinhos Cachoeira. O processo foi enviado pela Procuradoria-Geral da República na terça-feira (28) e deixa o parlamentar como suspeito de integrar uma quadrilha que opera jogo ilegal em Goiás. A pedido do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso, a corte também pediu a quebra do sigilo bancário do parlamentar e uma relação de emendas ao orçamento apresentadas por ele no Senado. [...] A suspeita é de que o senador transmitia informações a Cachoeira em troca de presentes. Ele nega as acusações. 
Além de Demóstenes, há outros possíveis envolvidos no esquema criminoso: os deputados por Goiás Rubens Otoni (PT), Carlos Alberto Leréia (PSDB) e Sandes Júnior (PP). Na terça-feira, em um acontecimento raro, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, recebeu parlamentares da Frente Mista de Combate à Corrupção e sinalizou "indícios robustos" para uma investigação, segundo o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). 
A pressão no DEM só aumenta para que Demóstenes deixe o partido. A situação dele se agravou depois de o Jornal Nacional, da TV Globo, relatou gravações da Polícia Federal em que Cachoeira -- preso em Goiás no início do mês durante a Operação Monte Carlo -- cita o senador seis vezes. Segundo a reportagem, as gravações foram feitas pela PF há um ano. Nas conversas, que duram cerca de cinco minutos, eles falam sobre dinheiro e contas do esquema ilegal de exploração de jogos de azar. [...] 
A assessoria de Demóstenes informou à Agência Brasil que ele já recebeu da Procuradoria-Geral da República os autos contendo dados das investigações que o envolvem. Se o DEM decidir abrir um processo contra o senador, será designado um relator para o caso e definido prazo de menos de um mês para a defesa. Há informações, veiculadas em vários veículos da imprensa, de que Demóstenes mantinha ligações com Carlinhos Cachoeira, preso por envolvimento com máquinas de caça-níqueis em Goiás. A suspeita é que o senador transmitia informações para o empresário, mantinha negócios com ele e recebia presentes. O parlamentar confirmou que ganhou de casamento um fogão e uma geladeira importados, no valor de R$ 30 mil, de Cachoeira.


        Não resta dúvida de que o currículo do senador é bem "marcante" para um paladino da moral e dos bons costumes, conforme ele mesmo dá ideia em seu blog de propaganda pessoal. 

         O portal Folha.com, hoje enriquece um pouco mais a folha corrida de Demóstenes, informando que:
O senador Demóstenes Torres (DEM-GO) utilizou o seu mandato para beneficiar os negócios do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, revelam gravações feitas pela Polícia Federal. De acordo com as escutas, divulgadas nesta sexta-feira (30) pelo jornal "O Globo", o senador acertou com o empresário ajuda em processo judicial e em projeto de legalização de jogos de azar em tramitação no Congresso. O empresário foi preso pela Polícia Federal no dia 29 de fevereiro, durante a Operação Monte Carlo. Nas gravações divulgadas pelo jornal, Demóstenes também fala com Cachoeira de negócios com a Infraero na época que ele era relator da CPI do Apagão Aéreo. Os grampos, segundo o jornal "O Globo", foram gravados durante a Operação Vegas. Em um diálogo gravado em 22 de abril de 2009, o empresário pede ao senador que faça um levantamento sobre o projeto de lei 7.228, que trata de jogos de azar. [...] Ele também pede a Demóstenes que fale com o então presidente da Câmara dos Deputados e agora vice-presidente, Michel Temer. O senador diz que vai tentar fazer com que o plenário da Câmara vote a proposta, o que não aconteceu. Em outra conversa, Demóstenes afirma que o texto do projeto, na verdade, prejudica Cachoeira. [...] Reportagem de "O Globo", publicada semana passada, com gravações da mesma operação já haviam mostrado que Demóstenes pediu dinheiro a Cachoeira para pagar despesas com táxi-aéreo, no valor de R$ 3.000. Na conversa, ao dizer que iria pagar, o empresário aproveita para pedir ao senador que o ajude em um processo judicial. [...] Outra conversa, gravada em 4 de abril de 2009, mostra também que os dois poderiam estar de olho em um milionário "negócio" em andamento da Infraero.[...] Investigações da PF também apontam que Cachoeira repassou informações sobre apurações contra o seu grupo a Demóstenes. A Folha obteve 12 mil páginas do inquérito da PF que culminou na Operação Monte Carlo. Ela investigou Cachoeira e mais 80 pessoas, todos denunciados neste mês pelo Ministério de Público Federal sob acusação de explorar máquinas caça-níquel e corromper agentes públicos para manter o negócio. No inquérito a que a Folha teve acesso, o nome de Demóstenes aparece, por exemplo, num relatório da PF sobre um diálogo gravado com autorização judicial no dia 13 de março do ano passado, às 15h37. Nele, conversam Carlinhos Cachoeira e o sargento aposentado da Aeronáutica Idalberto Matias, o Dadá --apontado pela Procuradoria como o principal araponga da quadrilha. Ambos estão presos. [...] Questionado sobre as gravações da Polícia Federal na Operação Monte Carlo, o advogado de Demóstenes Torres, Antonio Carlos de Almeida Castro, afirmou que elas não têm valor jurídico e são totalmente nulas. Isso porque o senador só poderia ser investigado com autorização do STF. O advogado afirmou não ter tido acesso à íntegra de todos os diálogos interceptados pela PF, mas critica a atuação da polícia.

         Considerando apenas os pequenos resumos publicados, dá para imaginar que a "ficha" do senador está "mais suja do que pau de galinheiro". Pois com tudo isso, ainda aparece um advogado para dizer que as provas não têm valor jurídico e que são totalmente nulas porque, provavelmente, um juiz autorizou as escutas e somente o Supremo teria essa prerrogativa. 


        A falta de bom senso leva, muito seguidamente, a declarações estapafúrdias. Se quem estava sendo investigado era um bicheiro - claro que cheio de influente "amiguinhos" - para que alguém iria ao Supremo? Quem imaginaria que o probo senador apareceria em todas as gravações, na maior intimidade? 

         Como acho que as perguntas acima são de difícil resposta, acredito que o escárnio sobre valor jurídico e provas nulas em nada amenizam os embutes promovidos pelo senador. Mas parece que teríamos uma situação em que o advogado começa a preparar os ingredientes para mais uma pizza na Esplanada dos Ministérios.

         Deixando a pizza para as "comissões" das casas representativas do povo brasileiro, a receita deste Fogão de Lenha é “Charque Acebolado”, que pode ser servido como entrada (acompanhado de um bom pão francês) ou como prato principal (com arroz branco e uma salada).



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CHARQUE ACEBOLADO

Ingredientes:

500 g de charque, cortado em cubos grandes
2 cebolas, cortadas ao meio e fatiadas
2 ou 3 colheres de azeite de oliva
1 colher de sopa de molho de soja (ou aceto balsâmico)
100  gramas de bacon picado
Pimenta-do-reino a gosto
Sal (se necessário) a gosto
Cheiro verde picado


Modo de preparar:

Lavar bem os pedaços de charque.

Colocar os pedaços em uma panela com água.

Deixe ferver por aproximadamente 10 minutos.

Escorra a água.

Lave, novamente, os pedaços de charque p/retirar o sal.

Coloque água novamente na panela e cozinhe o charque.

Quando estiver macio, retire os pedaços da água e deixe esfriar.

Desfie os pedaços, grosseiramente.

Colocar o bacon em uma frigideira grande com o azeite.

Quando o bacon estiver dourado, acrescente a cebola.

Frite, ligeiramente, a cebola.

Junte o charque desfiado e refogue um pouco mais.

Se necessário, acerte o sal.

Tempere com a pimenta-do-reino.

Acrescente o molho ou o aceto e misture bem.

Salpicar com cheiro verde e servir imediatamente.


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         A música para acompanhar a receita acima é "Pampa na Garupa", de Iedo Silva, com Iedo Silva e o grupo "Os Farrapos". 


 

         Um abraço e um abençoado fim de semana!

quinta-feira, 29 de março de 2012

GALERIA SERTANEJA – MEMÓRIA CADA VEZ MAIS CURTA


'Fui eu que o fiz', diz a minha memória.
'Não posso ter feito isso', - diz o meu orgulho e mantém-se inflexível.
Por fim - é a memória que cede.
(Friedrich Wilhelm Nietzsche)




Amigas e Amigos,

Em tempos de eleições é comum ouvir que o brasileiro tem memória curta. Normalmente, a afirmativa é associada a quantidade de candidatos (às vezes, eleitos) com passado ligado a corrupção. Por isso, é fácil imaginar que essa “memória” teria uma vida útil de pouco mais do que um ano, em boa parte das situações.  

         Parece, entretanto, que esse tempo está diminuindo – e de forma extremamente acelerada – migrando para algo em torno de pouco mais do que 20 dias. O fato que pode comprovar esse novo tempo para lembranças recentes está ligado a pendenga entre o governo brasileiro e a Fifa, por conta das declarações do secretário-geral da entidade (Jérôme Valcke), que sugeriu impulso enérgico com o pé na região glútea de “altas figuras” do governo e de seus comitês. 


 Fonte: http://www.matutando.com   
    
       O site “Portal da Copa” (http://copa2014.gov.br), no dia 3 de março, informava que o Ministro Aldo Rebelo teria rebatido a crítica do dia anterior feita por Valcke e vetado o secretário-geral da FIFA como interlocutor da Copa. O site disse que:
Em entrevista coletiva concedida na manhã deste sábado (03.03), em São Paulo, o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, anunciou que o governo federal vai comunicar oficialmente à FIFA que a entidade terá de eleger um novo interlocutor para tratar da organização da Copa do Mundo com o Brasil. [...]Na opinião do ministro, o secretário-geral da entidade, ao tecer críticas à organização do Mundial no país, fez uso de expressões consideradas "inaceitáveis", "descuidadas" e que "não correspondem aos fatos". [...]"O governo não pode ter mais o secretário-geral como interlocutor. A interlocução não pode ser através de quem emite declarações descuidadas, intempestivas, declarações dessa natureza. Vou comunicar oficialmente ao presidente da FIFA, Joseph Blatter, essa decisão. Precisamos de um interlocutor que tenha condições de entender o nível das responsabilidades e entendimentos necessários para esse tipo de relação. O governo tem se esforçado e continuará apoiando do jeito que é possível a realização da Copa do Mundo. Mas, no plano de todo o governo, o secretário-geral não pode ser mais o nosso interlocutor", afirmou Rebelo.

         Já no dia 5 deste mês, o ministro do Esporte cumpria sua promessa e encaminhava para a Fifa uma carta vetando a presença de Valcke como negociador (foi noticiado que o endereço do encaminhamento estava errado e o comunicado teria parado na sede do Comitê Olímpico Internacional, em Lausanne, ao invés de ir para a Fifa, em Zurique). As duas cidades ficam na Suiça, mas uma entidade não tem nada a ver com a outra. Na carta assinada pelo ministro, constava que “o Governo Brasileiro não pode mais aceitar, nas suas tratativas com a Fifa, o Senhor Jérôme Valcke como interlocutor durante a preparação desse mundial”.

         No próprio dia 5, Valcke encaminha um pedido de desculpas pelas declarações, dizendo que teria sido mal traduzido, pois só queria falar que havia necessidade de acelerar o ritmo das obras e da aprovação dos compromissos. Em minha opinião, as traduções estão bem feitas e como o secretário-geral não retirou o que disse, acredito que os proprietários dos traseiros governamentais devem continuar preocupados.

         Decorridos menos de 30 dias desde a indignação do ministro e de diversos integrantes do governo, parece que tudo foi esquecido e o que se viu hoje foi que Valcke não foi – e nem será – afastado da interlocução como negociador com o governo brasileiro. No portal “Terra”, hoje tem matéria dizendo que:
Em Zurique, a Fifa deixou claro mais uma vez que não tem a menor intenção de procurar um novo interlocutor para lidar com o gabinete da presidente Dilma Rousseff. A mensagem foi entendida e repercutida pelos representantes do futebol brasileiro que estão na Suíça participando das reuniões na sede da entidade máxima do futebol. [...] Jérôme Valcke participou da reunião nesta quarta-feira na sede da Fifa para discutir o andamento das obras para o Mundial de 2014. No encontro, o Brasil voltou a ser criticado pelos atrasos constantes. A situação da Arena de Recife foi considerada a mais preocupante e a cidade corre o risco de ser descartada da Copa das Confederações em 2013.

         Pelo exposto acima, pode-se constatar que nossa brasileira memória está com prazo de validade inferior a um mês. Em meio a essa baixaria propiciada por frases ofensivas sem propósitos, bravatas desproporcionais e sem grandes convicções, desculpas esfarrapadas, documentos de "fachada" lembrei de uma música, de Castilhos e Moacir, cujo título é "Que homens são esses". Inicialmente, fica a letra publicada abaixo.

  
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QUE HOMENS SÃO ESSES
                                           Francisco Castilhos e Carlos Moacir

Que homens são esses
Que fogem a luta
Será que não sabem as glórias do pago
Que homens são esses que nada respondem,
Que calam verdades, que reprimem afagos
Que homens são esses que trazem nas mãos o freio,
O cabresto, a rédea e o buçal
Que homens são esses que tem o dever de fazer o bem,
Mas só fazem o mal

Eu quero ser gente igual aos avós
Eu quero ser gente igual aos meus pais
Eu quero ser homem sem mágoas no peito
Eu quero respeito e direitos iguais
Eu quero este pampa semeando bondade
Eu quero sonhar com homens irmãos
Eu quero meu filho sem ódio, nem guerra
Eu quero esta terra ao alcance das mãos

Que sejam mais justos os homens de agora
Que cantem cantigas, antigas e puras
Relembrem figuras sem nada temer

Procurem um mundo de paz na planura
E encontrem na luta, na força e na raça
Um novo caminho no alvorecer

Desperta meu povo do ventre de outrora
Onde marcas presentes não são cicatrizes
Desperta meu povo, liberta teu grito
Num brado mais forte que as próprias raizes

Eu quero ser gente igual aos avós
Eu quero ser gente igual aos meus pais
Eu quero ser homem sem mágoas no peito
Eu quero respeito e direitos iguais
Eu quero este pampa semeando bondade
Eu quero sonhar com homens irmãos
Eu quero meu filho sem ódio nem guerra
Eu quero esta terra ao alcance das mãos.



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         Nessa Galeria, a interpretação do saudoso César Passarinho para "Que homens são esses".

 


         Um grande abraço e até a próxima!



TERTÚLIA NATIVA – CULTURA BRASILEIRA: FORTALECIDA, APESAR DA SAUDADE

O último refúgio do oprimido é a ironia,
e nenhum tirano, por mais violento que seja, escapa a ela.
O tirano pode evitar uma fotografia, não pode impedir uma caricatura.
A mordaça aumenta a mordacidade.
(Millôr Fernandes)




Amigas e Amigos,

A cultura brasileira é impactada pelas perdas de Chico Anysio e João Mineiro (para os quais já dediquei postagens aqui no blog), além de Ademilde Fonseca – a Rainha do Choro – e Millôr Fernandes – destacada figura da imprensa brasileira do século XX. Ademilde e Millôr morreram ontem, ambos no Rio de Janeiro.

         Neste mesmo momento em que ocorrem essas perdas, nosso país surpreende o mundo precisamente no contexto cultural. Segundo o portal “BBC Brasil” (http://www.bbc.co.uk/portuguese), três das dez exposições de arte de 2011 no mundo – considerando maior média diária de público – foram realizadas no Brasil, considerando um trabalho publicado pela revista americana The Art Newspaper.


Litografia “Répteis” (1943), de Escher, que integrou a mostra no CCBB.


         A matéria, do dia 23 último, no referido portal informa que:
A exposição O Mundo Mágico de Escher, que ficou de janeiro a março no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro, foi a de maior média diária de público no mundo em 2011, com 9.677 visitantes ao dia. As obras do artista holandês M.C. Escher atraíram um total de 573.691 pessoas. O centro carioca teve outras duas exposições entre as dez mais do ano – Oneness, da artista japonesa Mariko Mori, sétima com a maior média de público, com 6.991 visitantes diários entre abril e julho, e Eu em Tu, da americana Laurie Anderson, que atraiu uma média de 6.934 visitantes diários, na nona posição da lista. [...] A Art Newspaper destaca a surpresa de ter uma exposição no Brasil como a de maior média de público no ano. "Em vez de uma instituição americana, europeia ou japonesa, uma brasileira, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro, aparece na frente", observa a revista. "A antiga sede de banco no centro da cidade abrigou nada menos que três exposições entre as dez mais." Para a publicação, "o apetite brasileiro pela arte contemporânea é notável". A revista cita como um exemplo dessa fome de arte pelos brasileiros o fato de que o Instituto Inhotim, fundado pelo bilionário Bernardo Paz em um parque remoto no interior de Minas Gerais, atraiu um total de 770 mil pessoas ao longo do ano. Na lista de museus mais visitados também publicada pela revista, o Inhotim aparece na 70ª posição. Entre os cem museus mais visitados do mundo relacionados pela publicação, aparecem apenas mais três instituições: as sedes do CCBB no Rio (17º lugar, com 2,3 milhões de visitantes), em Brasília (45º, com 1,2 milhão) e em São Paulo (50º, com 1,1 milhão).
        Acredito que existam brasileiros, bem melhores esclarecidos culturalmente do que eu, que não se tenham surpreendido pela matéria da “BBC Brasil”. Mas, confesso que minha surpresa foi semelhante a da revista americana – semelhante porque a diferença está, talvez, no orgulho que senti por fazer parte dessa população e por ser funcionário deste Banco.
        
Continuando esta Tertúlia, uma pequena homenagem a este cartunista, humorista, dramaturgo, escritor e tradutor carioca, que nos deixou neste dia 27, aos 88 anos. Millôr Fernandes (que foi registrado como Milton Viola Fernandes), um dos fundadores do Pasquim, marcou época nas publicações O Cruzeiro, Veja e Jornal do Brasil, entre outras. Em 1964, Millôr publicou Fábulas Fabulosas, de onde foi retirada a história abaixo para enriquecer esta publicação.

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O REI DOS ANIMAIS
                             Millôr Fernandes


Saiu o leão a fazer sua pesquisa estatística, para verificar se ainda era o Rei das Selvas. Os tempos tinham mudado muito, as condições do progresso alterado a psicologia e os métodos de combate das feras, as relações de respeito entre os animais já não eram as mesmas, de modo que seria bom indagar. Não que restasse ao Leão qualquer dúvida quanto à sua realeza. Mas assegurar-se é uma das constantes do espírito humano, e, por extensão, do espírito animal. Ouvir da boca dos outros a consagração do nosso valor, saber o sabido, quando ele nos é favorável, eis um prazer dos deuses. Assim o Leão encontrou o Macaco e perguntou: "Hei, você aí, macaco - quem é o rei dos animais?" O Macaco, surpreendido pelo rugir indagatório, deu um salto de pavor e, quando respondeu, já estava no mais alto galho da mais alta árvore da floresta: "Claro que é você, Leão, claro que é você!".

Satisfeito, o Leão continuou pela floresta e perguntou ao papagaio: "Currupaco, papagaio. Quem é, segundo seu conceito, o Senhor da Floresta, não é o Leão?" E como aos papagaios não é dado o dom de improvisar, mas apenas o de repetir, lá repetiu o papagaio: "Currupaco... não é o Leão? Não é o Leão? Currupaco, não é o Leão?".

Cheio de si, prosseguiu o Leão pela floresta em busca de novas afirmações de sua personalidade. Encontrou a coruja e perguntou: "Coruja, não sou eu o maioral da mata?" "Sim, és tu", disse a coruja. Mas disse de sábia, não de crente. E lá se foi o Leão, mais firme no passo, mais alto de cabeça. Encontrou o tigre. "Tigre, - disse em voz de estentor -eu sou o rei da floresta. Certo?" O tigre rugiu, hesitou, tentou não responder, mas sentiu o barulho do olhar do Leão fixo em si, e disse, rugindo contrafeito: "Sim". E rugiu ainda mais mal humorado e já arrependido, quando o leão se afastou.

Três quilômetros adiante, numa grande clareira, o Leão encontrou o elefante. Perguntou: "Elefante, quem manda na floresta, quem é Rei, Imperador, Presidente da República, dono e senhor de árvores e de seres, dentro da mata?" O elefante pegou-o pela tromba, deu três voltas com ele pelo ar, atirou-o contra o tronco de uma árvore e desapareceu floresta adentro. O Leão caiu no chão, tonto e ensangüentado, levantou-se lambendo uma das patas, e murmurou: "Que diabo, só porque não sabia a resposta não era preciso ficar tão zangado".

MORAL: CADA UM TIRA DOS ACONTECIMENTOS A CONCLUSÃO QUE BEM ENTENDE.

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         Na parte musical, abro espaço neste Blog para outra homenagem: agora para a Rainha do Choro. Ademilde Fonseca, esta potiguar que acabara de completar 91 anos neste março, também nos deixou dia 27. As interpretações de Ademilde a consagraram como a maior intérprete do choro. Para fechar a Tertúlia, fica o baião "Delicado", de Waldir Azevedo e Ari Vieira, gravado por Ademilde Fonseca em 1951.

 

         Um grande abraço    com saudade de Ademilde e de Millôr    e até a próxima!


terça-feira, 27 de março de 2012

ORATÓRIO CAMPEIRO – SENHORA DA ANUNCIAÇÃO



Maria disse:
 “Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra”.
E o anjo retirou-se.
(São Lucas 1,38)




Amigas e Amigos,

Na primeira parte deste Oratório, trago para nossa reflexão duas notícias de hoje que me pareceram antagônicas. Uma delas publicada no portal “G1” e a outras pela “Folha.com”, envolvendo vereadores de diferentes cidades brasileiras.

         O portal G1 trouxe uma matéria sobre um projeto de lei que propõe acabar com o salário de vereadores em Santa Helena-GO, caracterizando tal função como trabalho voluntário. O projeto já foi protocolado por um vereador e deve levar, pelo menos, mais 30 dias para chegar ao plenário para votação, mas já provoca desconforto entre os demais membros do legislativo da cidade, que está localizada a cerca de 220 km de Goiânia. Diz a matéria do G1 que:
Para o autor do projeto, o objetivo é fazer com que os vereadores trabalhem no intuito de contribuir com a sociedade: “O vereador já tem a manutenção do seu trabalho, suas diligências, gasolina, telefone, assessor. Então, ele podia renunciar ao salário dele em favor da comunidade”. O presidente da Câmara Municipal de Santa Helena se diz contra o projeto de lei e defende que o salário é uma necessidade. “Aquele vereador que presta um bom serviço tem de ter um salário, tem de ser remunerado”, ressalta. O município tem nove vereadores com salário mensal de R$ 4.102. Somente com a folha de pagamento, a Câmara gasta em média R$ 37 mil. Em grandes centros como Goiânia, essa economia seria ainda maior. São 35 vereadores que recebem um salário mensal de R$ 10.560. Por ano, o corte na folha reduziria o gasto quase R$ 4,5 milhões.

         Pela declaração publicada do presidente da Câmara de Santa Helena, ele praticamente concorda com o projeto de lei, mesmo se dizendo contra, pois seu argumento considera que somente os vereadores que prestam bons serviços seriam remunerados. Mesmo não sendo exatamente o texto do projeto de lei citado, o efeito se aproximaria muito, pois a conseqüência da afirmação do presidente seria o não pagamento de salários para vereadores que não prestam bons serviços.

         Já em Ribeirão Preto-SP, o presidente da Câmara para ir de encontro à proposta de seu colega goiano ao afirmar pelo Twitter, ontem (26) que o salário de vereador deve ser "compatível com a sua função para que o mesmo não se veja tentado a aderir à corrupção". Na matéria da “Folha.com”, pode-se encontrar que o referido presidente:
decidiu usar a rede social para justificar o aumento do salário dos parlamentares, que vai passar dos atuais R$ 9.288 para R$ 12.991 na próxima legislatura. O presidente afirmou que decidiu responder pelo Twitter às perguntas e críticas consideradas por ele mal intencionadas – o aumento do salário, aprovado na semana passada, é alvo de manifestações contrárias no próprio Twitter e no Facebook. [...] Ele ainda criticou as pessoas que comparam o Legislativo com outras profissões. "São hipócritas", afirmou. [...] O aumento foi aprovado por 16 dos 20 vereadores.

         O que chama a atenção nessa depravação propiciada pelos vereadores de Ribeirão Preto ao aumentarem seus próprios salários em quase 40%, é que não precisaram fazer qualquer manifestação paredista para conseguirem o polpudo incremento salarial. Até porque se paralisassem suas atividades seria muito provável que ninguém percebesse. Lembro, ainda, que professores pelo Brasil inteiro batalham para que a lei seja cumprida e possam receber pequenos reajustes em seus salários e enfrentam grande resistência dos poderes constituídos, enquanto salários e verbas de duvidosas necessidades são aprovados na maior “cara-de-pau” por legisladores que, não raras vezes, sequer sabem o que seja lei.

Anunciação, Leonardo da Vinci

Estamos a nove meses do Natal e a Igreja reserva o dia 25 de março para celebrar a Solenidade de Anunciação do Anjo Gabriel a Maria, festa comemorada desde o século V. Pelo marcante acontecimento – sinal do início da obra que cumpre as promessas do Velho Testamento, com  o conhecimento do caminho para o Reino de Deus –, Maria recebeu o título de Nossa Senhora da Anunciação. O “sim” de Maria permite a chegada da Boa Nova para a humanidade. Nove meses antes de dar à luz seu divino filho, Maria se apresenta, conforme o Evangelho de Lucas, como “a serva do Senhor”.

Como parece que a grande maioria de nossos vereadores não parece muito consciente do que seja o serviço de representatividade que lhes é confiado por conta de uma eleição, convido a pedirmos a intercessão de Nossa Senhora para que se lhes aumente o discernimento.

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ORAÇÃO A NOSSA SENHORA DA ANUNCIAÇÃO

Todas as gerações
Proclamem-vos bem-aventurada, ó Maria!
Crestes na mensagem divina
E em vós se cumpriram grandes coisas,
Como vos fora anunciado.
Maria, eu vos louvo!
Crestes na encarnação
Do Filho de Deus no vosso seio virginal
E vos tornastes Mãe de Deus.
Raiou, então,
O dia mais feliz da história da humanidade
E Jesus veio habitar entre nós.
A fé é dom de Deus e fonte e todo bem,
Por isso, ó mãe,
Alcançai-nos a graça de uma fé viva,
Forte e atuante
Que nos santifica cada dia mais.
Que possamos comunicar
Com a vossa vida a mensagem de Jesus que é
O Caminho, a Verdade e a Vida da humanidade.
Amém!


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Para acompanhar a oração escolhida e lembrar que os vereadores tem compromisso com seus eleitores, fica a música "Arengação", de Ademir Guimarães, Jurandyr Mello e Sandro de Andrade, com a Banda Exodus.

 
  
Com votos de uma semana abençoada, desejo que a Paz de Cristo permaneça conosco!

segunda-feira, 26 de março de 2012

ABRINDO A PORTEIRA – VIOLA ESTÁ CHORANDO...


Quão pouco é preciso para ser feliz!
O som de uma gaita. - Sem música a vida seria um erro.
(Friedrich Wilhelm Nietzsche)




Amigas e Amigos,

         A surpresa e emoção do fim da jornada de Chico Anysio entre nós ainda era muito acentuada, quando aparece a informação de mais uma morte, agora relacionada ao universo da música sertaneja. Morreu na noite de sábado, em Jundiaí-SP, João Sant’Angelo, conhecido no meio artístico como João Mineiro, aos 76 anos de idade.

João Mineiro

         João Mineiro marcou a música sertaneja com um trabalho que se estendeu por várias décadas. No início de sua caminhada, provavelmente em meados dos anos 50, foi apenas Joãozinho e formou uma dupla, com Mário Antônio de Lima, pai dos conhecidos Chitãozinho & Xororó, com o nome artístico de "Joãozinho & Marinho".

         No final dos anos 50, o Joãozinho se transformou em João Mineiro e formou a dupla “João Mineiro & Mulatinho”, que gravou alguns “78 rotações” entre 1959 e 1962.

No início dos anos 60, com novo parceiro surge a dupla "João Mineiro & Zé Goiás", cuja principal característica era um trabalho de música raiz com viés humorístico, que ainda chegou a gravar “78 rotações” e, pouco antes do fim da dupla, deixou gravado seus primeiros LPs.

No início dos anos 70, surge sua parceria mais famosa, com a participação de José Marciano, representada pela dupla "João Mineiro & Marciano", cujo sucesso foi tão grande que, na década de 80, eles apresentaram um programa no SBT, conhecido pelo próprio nome da dupla. Seus sucessos marcantes são da época dessa dupla, quando venderam mais de 20 milhões de discos, no Brasil e no exterior. Em 1993, a dupla foi desfeita por motivos até hoje não muito claros, mas os discos da dupla continuaram a ser lançados – coletâneas – até 2003, pelo menos.

Com o fim da dupla, João Mineiro parte para novos trabalhos e forma as duplas "João Mineiro & Marino" e "João Mineiro & Marcian", mas cada uma delas gravou apenas um disco antes de serem desfeitas.

Logo em seguida, João Mineiro inicia um novo trabalho com José Domingues (ou Domingos) de Aquino, um caminhoneiro que se apresentava como “cover” de Marciano, surgindo a dupla na qual trabalhou até a parada cardíaca, no último sábado, interromper sua trajetória: "João Mineiro & Mariano". A nova dupla, que gravou diversos discos e um DVD, estava preparando mais um DVD, com participações especiais de amigos.

         A música escolhida para essa homenagem do Blog a João Mineiro – porque penso que muitas violas choram a ausência desse artista – é “Viola está chorando”, de Elias Muniz, com a dupla, na minha opinião, mais representativa de sua caminhada artística: João Mineiro & Marciano.

 

Um grande abraço e até a próxima!

PROSA DE DOMINGO - CHICO ANYSIO, A SAUDADE NÃO SERÁ "VAPT-VUPT".


O que me levou a esta atividade foi o fato de gostar de contar histórias,
pois antes de tudo, o que eu faço de melhor é exatamente contar uma história.
(Chico Anysio)



Amigas e Amigos,

No próximo dia 12 de abril, ele acrescentaria mais um aniversário aos oitenta que teve oportunidade de festejar. Mas sua passagem aqui pela terra foi interrompida para o Céu ficar mais animado. Morreu Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, um marco do humor conhecido, e reconhecido, com Chico Anysio.

E o Brasil – que segundo Chico só tinha três problemas: o café, o almoço e o jantar – perdeu uma de suas principais alavancas para alguns momentos de alegria no meio de toda a corrupção e impunidade consentida, que tanto entristece aos que acreditam em um país melhor.

          A morte de Chico Anysio deixa o Brasil com sentimento de pesar, ainda que somente o Ceará (onde nasceu) e o Rio de Janeiro (para onde se mudou aos seis anos) tenham decretado luto oficial de três dias, pois durante os períodos em que esteve hospitalizado ficava sempre a expectativa de sua cura e de um retorno do seu bom humor, sempre reinventado e renovado.



          Mas desta vez, ele não voltou e fiquei imaginando a expressão de São Pedro ao chamar “- O próximo é... Chico Anysio.” e ao levantar os olhos perceber que Chico Anysio não era apenas o próximo, mas os 209 próximos. Entre os 209 estava Professor Raimundo, esperando, até o fim, um salário melhor que não pode receber por haver muitas “licitações” e muitos políticos sustentados pelo desperdiçado dinheiro público.

          Lembrei-me de Chico Anysio sendo aguardado aos domingos no Fantástico, onde fazia um momento de diversão para as famílias, com um humor jamais substituído. Era um quadro com conteúdo, dinâmica e alegria, que não precisava qualquer rótulo, sendo simplesmente o Chico no show da vida. Com o passar do tempo, o que ele fazia desde os anos 70 passou a ser conhecido como stand up comedy, como se alguém tivesse inventado um novo jeito de fazer as pessoas rirem. Foi nesse quadro que surgiram personagens de Chico e, talvez o mais marcante, tenha sido o malandro Azambuja que, por volta de 1975, ganhou vida e chegou a ter um programa só seu.

          Nestas últimas horas, foram muitas homenagens. O futebol, uma paixão de Chico marcada pelo personagem Coalhada, também abriu espaço para exaltá-lo, e, no “melhor estilo”, seus times em São Paulo – Palmeiras – e no Rio – Vasco, sua grande paixão – entraram em campo com nomes de seus personagens nas camisas dos jogadores, fazendo “graça”: o Palmeiras perdeu e o Vasco só conseguiu um suado empate. Ainda bem que Chico foi homenageado também em outros campeonatos por todo o Brasil.

          Na última sexta-feira, fui assistir a peça “A mecânica das borboletas”, de Walter Daguerre, com direção de Paulo Moraes, no Centro Cultural Banco do Brasil, aqui em Brasília. No elenco, Ana Kutner, Otto Júnior, Suzana Faini e Eriberto Leão que, ao final do espetáculo pediu uma salva de palmas para homenagear Chico Anysio. Foi emocionante ver toda a plateia, em pé, aplaudir durante um bom tempo.
          O velório de Chico Anysio, sábado, foi no Teatro Municipal do Rio de Janeiro e nessa sua última passagem por esse templo da arte foi marcada por aplausos de tantos quantos por lá passaram. Maior ainda, acredito, foi o aplauso silencioso no coração de tantos que admiraram esse artista tão importante para arte brasileira e notadamente para o humor dessa nossa terra.

          Chico foi humorista, ator, dublador, escritor, compositor e pintor brasileiro. Nos anos 70, formou com o saudoso Arnaud Rodrigues (Antônio Arnaud Rodrigues) o grupo “Baiano & Os Novos Caetanos”, do qual fazia parte, também, Renato Piau (Renato Costa Ferreira). Do primeiro LP do grupo, onde Chico era o “Baiano” e Arnaud, o “Paulinho Boca de Profeta”, escolhi para esta homenagem a música “Selva de Feras”, de Arnaud Rodrigues e Orlandino.

   

          Um grande abraço para todos!