quinta-feira, 17 de março de 2011

GALERIA SERTANEJA - FELIZ, AINDA QUE A VIOLA QUEBRE

Amigas e Amigos,


            Hoje, vou conversar com vocês sobre uma música que já mereceu inúmeras regavações, mas que, acredito, vale a penas conhecer um pouquinho mais dessa obra. Antes, não posso deixar de comentar uma matéria que li - com enorme alegria e felicidade - no portal do jornal Zero Hora (http://zerohora.clicrbs.com.br/), ontem, associando felicidade com sucesso. Está escrito no jornal que:
A Associação Americana de Psicologia da Universidade da Califórnia comprovou, através de uma pesquisa envolvendo 275 mil indivíduos, que pessoas felizes estão predispostas a buscar e realizar novos objetivos. A psicóloga do Portal Educação acredita que felicidade também é uma consequência de emoções positivas: — Podemos dizer que pessoas otimistas, com pensamentos positivos, têm mais tendência a alcançar as metas e objetivos traçados na sua vida pessoal e profissional, alcançando assim, a realização de seus sonhos e a conquista do sucesso — , complementa. O estudo também revelou que a felicidade não resulta apenas em sucesso, mas também pode desempenhar sucesso quando aliada à inteligência, experiência, aptidão física e família. Os especialistas da pesquisa escolheram três tipos diferentes de evidências que visaram a reforçar a autoconfiança dos participantes e estabelecer relações de causa e efeito entre felicidade, sucesso e afeto positivo.

            Essa matéria me fez lembrar um (pseudo) gestor - de uma incompetência e de um despreparo que nunca havia presenciado antes -, com quem tive de trabalhar por um curto período de tempo. Era uma figura com uma (falta de) visão administrativa tão folclórica que se poderia classificar como bizarra. Em uma oportunidade, ele chegou a manifestar que não suportava minha presença, pois eu sorria tanto que minha felicidade o incomodava. Acredito que ele possivelmente diria que a Associação de Psicologia citada na matéria da Zero Hora não seria digna de confiança (e fico imaginando quantos seriam os bajuladores de plantão comentando sobre ele que "esse sim, é o 'cara'!).

            E chega de chatear vocês com reminiscências, pois a música escolhida para a Galeria Sertaneja de hoje é bem mais interessante. Falo da bonita "Viola quebrada" que, em 2006, foi objeto de um artigo publicado pela Profª. Joyce Elaine de Almeida, do Departamento de Letras Vernáculas e Clássicas da Universidade Estadual de Londrina, com o título "VIOLA QUEBRADA": LINGUAGEM E ESTILO CARACTERÍSTICOS DO FALAR CAIPIRA (disponível em http://cpd1.ufmt.br/meel/arquivos/artigos/269.pdf). A Profª. Joyce afirma que:
Na canção “Viola quebrada”, Mário de Andrade resgata musicalmente a cidadania do falar caipira brasileiro, valorizando a identidade lingüística que o constitui. Ou seja, tenta quebrar com sua moda de viola, já no início do século passado, o estereótipo – infelizmente ainda em voga no país - de que essa linguagem seria algo feio, errado, produzida por gente descuidada, uma deturpação da língua rica, boa, encerrada nas gramáticas e nos dicionários. Musicalmente Andrade evidencia que o falar caipira se constitui numa das mais belas formas de os brasileiros se manifestarem. Em suma, Mario de Andrade, um lingüista avant la lettre, mostra por meio do falar caipira, que a língua portuguesa no Brasil possui seu colorido especial de variadas nuances devido a diversos fatores que contribuíram e contribuem para sua diversificada manifestação.
            Podemos aferir que a linguagem musical está muito mais associada ao emissor (compositor/intérprete) e ao receptor (ouvinte) da mensagem do que propriamente ao gramaticalmente correto que, em alguns casos, torna as mensagens muito mais chatas, dificultando o relacionamento citado entre emissor e receptor.

            Se você ainda não conhece a letra da música, publico-a logo abaixo para que as considerações da Profª. Joyce possam ser observadas.


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VIOLA QUEBRADA

Mário de Andrade

Quando da brisa no açoite a frô da noite se acurvou

Fui s’incontrá co’a maroca, meu amor

Eu tive n’arma um choque duro

Quando ao muro já no escuro

Meu oiá andou buscando a cara dela e não achou

Minha viola gemeu

Meu coração estremeceu

Minha viola quebrou

Teu coração me deixou

Minha maroca resorveu para gosto seu me abandonar

Pruquê os fadista nunca sabe trabaiá

Isso é besteira que das frô que bria e chera a noite inteira

Vem dispois as fruita que dá gosto de saborear

Pru causa dela eu sou rapaz muito capaz de trabaiá

Os dia inteiro e as noite inteira capinar

Eu sei carpir pruquê minh’arma ta arada e loteada

Capinada co’as foiçada dessa luz do teu oiá.

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            Após ler a letra, vale a pena recorrer novamente ao artigo da Profª. Joyce, no momento em que ela faz uma análise do texto da canção, dizendo que:
No texto o poeta retrata a perda de um amor, porque “os fadista nunca sabe trabaiá”. Nota-se aí uma visão negativa a respeito daquele que se ocupa da arte de cantar. Trata-se de um senso comum registradodo pelo autor. Ressalta-se que tal idéia é, em seguida, contestada pelas afirmações presentes nas linhas 12 e 13: “Isso é besteira que das frô que bria e chera a noite inteira/ Vem dispois as fruita que dá gosto de saborear.” Verifica-se, neste trecho, uma comparação entre as flores que brilham e exalam odor durante a noite com o arte de cantar; a partir desta comparação, deduz-se que o artista também é capaz de “dar bons frutos”. Desta forma, o poeta já apresenta idéias positivas à arte de cantar. Cabe ressaltar a poesia presente na canção, já iniciada por uma metáfora indicando o entardecer: “Quando da brisa no açoite a frô da noite se acurvou” (linha 1). Verifica-se aí o tom poético do autor ao retratar o anoitecer em que a Lua, caracterizada como a “frô da noite”, se acurvou. Além disso, verifica-se também uma prosopopéia: “Minha viola gemeu”. (linha 6), em que o poeta personifica a viola, apresentando-a com um ser emotivo, fato bastante convincente, pois pertence a um “fadista”. No decorrer da história apresentada na canção, ocorre uma transformação do fadista, que passa a trabalhar. Isto se verifica nos últimos versos: “Eu sei carpir pruquê minh’arma ta arada e loteada/ Capinada co’as foiçada dessa luz do teu oiá”.


            Após essa instigante análise presente nesse artigo (que recomendo sua leitura na íntegra pois pode ser acessado no endereço publicado acima), escolhi, para interpretar "Viola Quebrada", alguns amigos -foram entrevistados no programa Canto da Terra, quando se apresentaram em Brasília-DF - que se inspiraram nessa canção para criar o grupo "Viola Quebrada", no Paraná. O grupo é composto por Oswaldo Rios, Margareth Makiolke, Rogério Gulin e Rubens Pires e você pode conferir abaixo.


            Por aqui, termino a Galeria de hoje, deixando um grande abraço!

Wilmar Machado

2 comentários:

  1. Viola quebrada consegue transmitir o sentimento de uma maneira singular. Certamente a linguagem "culta" não teria o mesmo alcance.
    Parabéns Wilmar pelo excelente post.
    Um grande abraço,
    Cesar Ribeiro.

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  2. Cesar,
    Obrigado por sua mensagem.
    Um grande abraço!
    Wilmar Machado

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