quarta-feira, 20 de junho de 2012

TERTÚLIA NATIVA – CONCHAVOS E PAGODE EM BRASÍLIA


Porque quando alguém, meu caro, vangloria-se
de ser um homem honrado, depois de dar
a sua palavra, esta deve ser sagrada.
E mesmo que a estrada seja longa, feia ou bela,
custe o que custar, nem que ele tenha de ser morto,
mas a sua palavra deve ser mantida.
(C. Pascarella)



Amigas e Amigos,



Notícias da capital de todos os brasileiros podem levar a um entendimento de que a colaboração das delegacias de polícia de Brasília para o sucesso das PPP é extremamente significativa. Na edição desta quarta-feira do jornal Correio Braziliense, encontram-se duas matérias que podem levar ao entendimento apresentado aqui.

Fonte: Dave Brown IN http://www.englishblog.com 


A primeira matéria trata de condenações do delegado da Polícia Civil do Distrito Federal, João Kleiber Ésper, que está preso no Complexo Penitenciário da Papuda e poderá cumprir penas que somariam 4 anos. Diz a matéria que:
Condenado em 2010 pelos crimes de prevaricação e ocultação de documento ao omitir depoimento que prejudicaria o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), ele era um foragido procurado até pela Interpol. Acabou detido por ex-colegas de instituição, apoiados por policiais federais, na noite da última segunda-feira, no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, ao desembarcar de uma viagem aos Estados Unidos. Transferido para a Papuda, ele vai cumprir as penas impostas pela 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do DF em dezembro de 2010: seis meses por prevaricação — retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício — e três anos e seis meses por ocultar documento. As condenações se referem a falhas cometidas no depoimento do advogado Bruno de Miranda Ribeiro, em 2007, contra Renan Calheiros, então presidente do Senado. Bruno acusou o ex-sogro, o empresário Luiz Carlos Garcia, de montar esquema de arrecadação de dinheiro para Renan nos ministérios chefiados pelo PMDB. O depoimento ficou sete meses parado na mesa do delegado João Kleiber, então chefe da 30ª Delegacia de Polícia (São Sebastião). O caso veio à tona em 2007, no auge do escândalo em que o senador foi acusado de receber dinheiro da Mendes Júnior para pagar pensão à filha que teve com a jornalista Mônica Veloso. Acusado de quebra de decoro, Renan escapou da cassação no Senado.

Considerando que o senador Calheiros se mantém legislador, sem qualquer arranhão aparente; que o delegado aposentado está preso para cumprir pena de 4 anos, que rapidamente poderão ser permutados por alguma pena alternativa (que geralmente são mais alternativas do que penas); que o PMDB nem se abalou; e que o(s) empresário(s) continuam empresário(s), fica a impressão de que essa parceria entre as partes conhecidas foi exitosa e o dinheiro arrecadado foi aplicado nas contas dos envolvidos.

Outra matéria informa que a delegada Martha Vargas, acusada de falsidade ideológica “y otras cositas mas”, foi afastada de suas funções pela Polícia Civil. Na reportagem, consta que:
A direção-geral da Polícia Civil do Distrito Federal afastou do serviço a delegada Martha Vargas, lotada na 10ª Delegacia de Polícia, no Lago Sul, por ter usado de forma inusitada uma vidente para apontar supostas provas, além dos assassinos do advogado José Guilherme Villela, da mulher dele, Maria Villela, e da empregada do casal, Francisca Nascimento da Silva. Martha é acusada de falsidade ideológica, fraude processual, denunciação caluniosa, violação de sigilo funcional e tortura com o objetivo de obter uma confissão falsa durante a condução de um dos inquéritos mais conturbados da história policial da capital do país. [...] Além de Martha Vargas, o agente José Augusto Alves foi afastado do serviço. Ele responde por fraude processual, denunciação caluniosa e tortura. Os dois ficarão longe da delegacia, mas durante esse período receberão salários. Como titular da 1ª Delegacia de Polícia, na Asa Sul, Martha teria produzido provas ilegais e plantado evidências a fim de incriminar três pessoas. [...] As chaves supostamente encontradas na casa de dois suspeitos e apresentadas pela delegada como prova de que havia desvendado o crime, na verdade, foram levadas por policiais civis da própria casa dos Villela, segundo aponta o MPDFT. Constam em fotos registradas no apartamento, mas não haviam sido incluídas nos autos de apreensão. [...] a policial civil trocou informações com a vidente Rosa Maria Jaques e o marido dela, João Tocchetto de Oliveira, sobre o inquérito do triplo homicídio ocorrido na 113 Sul. Mesmo sendo um caso tão intricado e de difícil solução, a delegada compartilhou dados secretos com a profissional que cobra para ter visões.

Da presente matéria, pode-se depreender que a parceria entre o público (delegada e agente) e o privado (vidente e outros interessados na fantasiosa versão) só não foi um completo sucesso porque o Ministério Público atrapalhou o grupo. Mesmo com essa atitude o MPDFT, ainda é possível acreditar no sucesso da parceria, pois a delegada e o agente continuam recebendo seus salários – sem trabalhar – e, com um bom programa de marketing, a vidente pode explorar suas previsões – com auxílio tecnológico – para futuros contratos.

Como se não bastasse tudo isso, um dos senadores de Brasília resolveu fazer autopromoção na televisão e se apresenta como grande benemérito da capital, que – segundo seu entendimento – está sendo beneficiada por seus maravilhosos projetos. O mais chocante é ouvi-lo falar de seu “trabalho sério” e se intitular “o seu senador”. Com certeza não é “meu” e será muito difícil ser de alguém, pois sequer foi eleito – era suplente de Roriz, que renunciou para não ser cassado – e foi empossado antes da Lei da Ficha Limpa ser aprovada. Sobre o trabalho sério, consta no portal da revista “Isto é”, de 23/12/2009, que o mencionado senador:
responde a processo no STF por lavagem de dinheiro, crimes contra o patrimônio, apropriação indébita, ocultação de bens, peculato e corrupção passiva. O processo tramita em segredo de Justiça, e não se conhece em detalhes o teor da acusação sobre operações financeiras que Argello não conseguiu identificar. O senador do PTB também foi acusado de envolvimento num esquema de mudança de destinação de lotes na Câmara Distrital. Pelo esquema, áreas rurais desvalorizadas são transformadas em áreas residenciais e áreas para restaurantes viram disputados lotes para postos de gasolina. Esse esquema também teria funcionado nos condomínios de Brasília, pendentes de legalização.

Para não deixar que tanto desnorteamento na capital altere significativamente o nosso humor, o causo escolhido para hoje – que tive oportunidade de apresentar no programa Chimarreando com Deus, na Rádio Aliança FM, de Porto Alegre-RS, no início do mês de março do ano de 1996 – é do livro “Causos da Querência: literatura oral”, da Editora da Universidade de Caxias do Sul (1985), do contista de Quaraí-RS, Sejanes Dornelles.


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COSTUMES DE ANTIGAMENTE
                                       Sejanes Dornelles

Lá pelos idos de mil e novecentos e dezoito, quando eu tinha seis anos, começaram a aparecer, no Alegrete, os primeiros fordecos de “bigode”, os chamados “modelo T”.

Naquelas recuadas épocas, posto de gasolina era manga de colete.

Havia coisas que hoje causam espanto às gerações novas. O sanitário nas residências, nas cidades da fronteira, e até nas escolas, era uma simples depressão no terreno ou então uma casinha mambembe, no fundo do quintal.

Quanto ao material de limpeza, nem se fala. Pra lavar a cabeça, sabão preto feito em casa. Papel higiênico era desconhecido. Quando entrou na região, veio nos trens de passageiros. O pessoal chamava de “papel de trem”.

Na campanha, então era tudo mais precário. A latrina, na maioria das casas, era atrás da mangueira.

O índio velho se apertava ou chegava nas casas meio mal da barriga e já ia dando uma olhada pro lado da mangueira, geralmente de pedra, oferecendo um tapume perfeito.

De uma feita, um caxeiro viajante se mandou por aqueles pagos, num dos primeiros fordecos de “bigode”. No Alegrete, conseguiu uma lata de gasolina, que o estoque estava mais curto do que coice de porco.

O nosso homem se largou do Alegrete, rumo a São Chico de Assis. Lá fez a praça e se mandou em direção a Santiago do Boqueirão.

Mas, como ia dizendo, o taura se tocou, como quem vai pras pitangas, sem atinar que naquelas localidades, não havia chegado o progresso do auto. Ao entrar o sol, o fordeco deu umas duas ou três tossidas fortes e empacou. Foi aí que o nosso viajante atinou com a causa. Faltou “nasta” como dizem os castelhanos.

O vivente se viu perdido naqueles cafundós à boca da noite. Deu uma olhada pra frente e pra trás, nem viva alma na estrada. Olhou para os campos. Lá na encosta de um serro, divisou um rancho, fumaceando como um sinal de vida. Tirou uma mala do fordeco e se botou a pé em direção à morada.

Quando chegou, os cuscos deram o aviso. Saiu o dono do rancho. Era um posteiro da estância da Tuna.

– Chegue-se no mais paisano, os cuscos não mordem.

Explicando o motivo, o viajante pediu pousada.

– O rancho é de pobre, mas sempre tem lugar.

Veio o mate, que não há outra maneira de receber na campanha. A siá Libinda, mulher do posteiro, se foi ao galinheiro. No escuro mesmo, pelo tanteio no mais, pescoceou a carijó mais gorda que havia.

Foi um zás, enquanto os dois homens proseavam, ela aprontou a galinha com arroz.

O viajante, com a promessa de no outro dia irem rebocar o auto, foi dormir. O Jango arrumou um catre num canto da pecinha de chão batido. E recomendou:

Qualqué coisa que o sinhô percisá é só me chamá que eu atendo. Durmo aqui de lado.

– Não vai ser preciso amigo, vá descansar.

– Não vá sofre percisão, qualqué coisa... me chame...

O viajante dormiu logo. Lá pelas tantas, por ter dormido de estômago cheio, teve um pesadelo. Ele tinha mania de jogar na loteria. Tudo que é número que via, assim meio estranho, tomava nota. Chegando na cidade comprava o bilhete. Já tinha tirado lascas na “grande”, acertando aproximações.

Como disse, sonhou que apareceu um anjo, todo luminoso e escreveu na parede do rancho, 12.942.

Viu bem aquele número. Deu um salto no escuro. Lascou os fósforos. Acendeu o candieiro. Mexeu na maleta. Achou o lápis, com a preocupação de não perder o número, remexeu procurando onde anotar...

O posteiro escutou o ruído. Viu o clarão do candieiro...

– O que que hai seu moço?

O viajante aflito, pensando no número...

– Me arrume um pedaço de papel, ligeiro.

O posteiro, pensando em outra coisa, mandou a resposta:

– Não é perciso... atrás da mangueira tem sabugo!...


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         Para animar um pouco mais a Tertúlia de hoje, fica a música "Pagode em Brasília", composta em 1959 por Teddy Vieira e Lourival dos Santos, interpretada pela dupla que consagrou o pagode sertanejo Tião Carreiro e Pardinho.

 


         Um grande abraço e até a próxima!

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