O que tu fazes agora não é viajar, mas sim andar à deriva,
a saltar de um lado para o outro, quando na realidade o que tu pretendes
- viver segundo a virtude - podes consegui-lo em qualquer sítio.
(Lucius Annaeus Séneca)
Amigas e Amigos,
Na Tertúlia de hoje, comento – sem qualquer perplexidade, por estar me acostumando a devaneios – a audiência pública no Congresso que contou com a participação do ministro do Turismo, por conta das denúncias contra sua pasta.
Sobre esse assunto, o portal UOL (http://www.uol.com.br), apresentou uma matéria que inicia com o seguinte texto:
Em sua primeira audiência pública no Congresso desde o surgimento de denúncias em sua pasta, o ministro do Turismo, Pedro Novais, negou que soubesse das irregularidades veiculadas pela imprensa sobre possíveis desvios de recursos públicos do ministério em convênios com entidades sem fins lucrativos. “Se houve deslizes por irregularidades, não sei, mas admito que, pelo que aconteceu, alguma coisa pode ter havido, mas isso esta sendo corrigido e será francamente eliminado”, disse nesta quarta-feira (17), em audiência conjunta das comissões de Fiscalização Financeira e Controle; de Defesa do Consumidor; e de Turismo e Desporto da Câmara dos Deputados.
Mesmo consciente de já estar acostumado com os desvarios de autoridades constituídas, ainda sou surpreendido. A frase, atribuída ao ministro pelo portal, traz em seu início o conteúdo elucidativo que permitiu ao ministro tornar muito clara a sua negativa sobre as irregularidades denunciadas: “Se houve deslizes por irregularidades, não sei, mas admito que, pelo que aconteceu, alguma coisa pode ter havido...”. Ele não sabe se houve irregularidades, mas sabe o que aconteceu e esses “acontecimentos” conhecidos podem indicar irregularidades. Agora, ficou tudo claro. Ou seja, com essa frase o ministro não pode ser acusado de estar enchendo lingüiça, pois a “enrolação” é tão vazia que somente encheria o embutido de ar.
Na intenção de entender bem a filosofia turística, continuo pensando sobre a seqüência da frase: “...alguma coisa pode ter havido, mas isso esta sendo corrigido e será francamente eliminado”. Se eu entendi bem, estão corrigindo “alguma coisa” sem saber se essa “coisa” existe – acredito que conheci hoje o supra-sumo do antecipatório. Mas, continuando até o fim da frase, uma nova surpresa, pois a desconhecida coisa – que deve estar errada – está sendo corrigida e quando tudo estiver corrigido, será (penso que aqui ficaria bem um “tchan-tchan-thcan-tchan”) “francamente eliminado”. Francamente, ministro, que frase para uma audiência, além de pública, conjunta de diversas comissões.
Depois da brilhante embromação do ministro, lembrei de um causo do livro “Contando Causos”, do Rolando Boldrin, que faz parte do capítulo referente a “Otoridades e os tar de políticos (ou Ocê sabe cum quem tá falando!)”, que transcrevo abaixo, mostrando que para “enrolar” não é necessário ser ministro.
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NOS TEMPOS DO CANGAÇO
Rolando Boldrin
Só pra não dizer que eu só conto causos de caipira paulista – o que sou, com muita honra –, tem um lá do Nordeste, bem antigo. Dos tempos em que existiam vários bandos de cangaceiros e os dito cujos eram perseguidos pela polícia chamada de “volante”. Tem um causinho bem conhecido que serve de preâmbulo pra outro que em vou contar depois. Sobre um daqueles ataques às vilas, num entrevero com a polícia, contava um velho cangaceiro, lembrando suas façanhas: “Naquela batalha morreu tanto sordado, mas morreu tanto sordado... que urubu só comia de sargento pra cima”.
Pois bem. O causo que eu vou contar agora aconteceu no dia em que a volante conseguiu, depois de muitos anos, prender o tão temido Capitão Ordovino. Cangaceiro dos bão. Da estirpe sanguinária do velho Lampião.
Na frente da mesa do delegado, estava o cangaceiro de cara amarrada – pois, afinal, o dito cujo tinha se deixado apanhar e agora deveria amargar uns belos anos atrás das grades. O delegado, por sua vez, não cabia em si de tanto orgulho.
DELEGADO (se recostando na poltrona) – Muito bem, capitão Ordovino. Até que enfim, heim? Depois de tanto tempo, agora a minha polícia, sob o meu comando, consegue pegar o sinhô. Agora o sinhô vai vê o que é bom. Tantos anos saqueando, matando e zombando da gente e até do governo...
CAPITÃO (num resmungo, de cabeça baixa) – Éééé...
DELEGADO – Capitão Ordovino? Antes do sinhô ir pro xilindró, conta aqui pra gente: quantos homens o sinhô já matou nessa vida de cangaceiro?
CAPITÃO (reluta e balbucia) – É dois.
DELEGADO (não acredita no que ouve) – Como é que é? Péra aí! O sinhô não entendeu a pergunta. Eu perguntei quantos homens o sinhô já matou até hoje...
CAPITÃO (firme e articulado) – É dois.
DELEGADO – Deixa de sê cara-de-pau. Como o sinhô tem a coragem de dizer que só matou dois homens até agora?
CAPITÃO (insistente) – É dois mêmo!
DELEGADO – Olha aqui. O sinhô é tão descarado. Além de tudo, ainda mentiroso. Veja aqui (mostra um papel). Só numa lista que eu tenho aqui comigo, tá marcado que o sinhô mato 10! 10 homens. Olha aqui (mostra)!
CAPITÃO (sem ler, justifica) – Só se o sinhô tá contando aqueles 8 buliviano...
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A música desta Tertúlia Nativa é “No jeitinho brasileiro”, de Berenice Azambuja e Vaine Darde, na interpretação de Berenice Azambuja, dando uma amostra de como se pode “viajar” por este Brasil sem depender de Ministério de Turismo.
Um grande abraço e até a próxima.
Wilmar Machado
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