Quando vemos um gigante, temos primeiro de examinar a posição do sol
e
observar para termos certeza de que não é a sombra de um pigmeu.
(Friedrich
Von Hardenberg Novalis)
Amigas
e Amigos,
Notícia de ontem, do portal G1, sobre a
aplicação de golpes de um “falso” prefeito
que teria aplicado golpe em empresários merece uma reflexão. Não penso que, no
contexto apresentado, o crime de estelionato ou a assunção de cargo de maneira
fraudulenta possam ser a grande inquietação.
Antes de continuarmos as considerações sobre
essa temática, penso ser interessante publicar a informação do G1:
O homem, suspeito de aplicar golpes em empresários se passando por prefeito de várias cidades, preso nesta quarta-feira (09) em Bauru, SP, tem uma ficha criminal de mais de 10 metros. Ele já havia sido preso pelo mesmo tipo de golpe em 2006 e respondia em regime aberto quando foi flagrado cometendo o mesmo crime. O homem, de 61 anos, se apresentava como prefeito para donos de construtoras e empresas de pavimentação asfáltica. O golpista mostrava interesse em contratar os serviços, mas, em contrapartida, pedia doações em dinheiro para reformar escolas e creches. “Mas, tudo não passava de um golpe muito bem articulado. Ele sempre pedia para os empresários ligarem no celular dele porque ele estaria em viagem ou compromissos fora, para assim a pessoa não ligar da prefeitura e constatar que era um golpe e não estava realmente falando com o prefeito”, explica o delegado Jader Biazon. Imagens gravadas pela polícia durante as investigações mostram o golpista e seus comparsas sacando, no banco, o dinheiro depositado pelas vítimas. Segundo a polícia, pelo menos 50 empresários de São Paulo, Minas Gerais e Paraná caíram no golpe e doaram entre R$2 mil e R$25 mil. O golpista escolhia empresas que já tinham prestado serviços às prefeituras de grandes cidades, e se passava por prefeito de municípios vizinhos. O mapa feito pela polícia mostra a extensão alcançada pelos golpistas. Na região Centro-Oeste, eles conseguiram tirar dinheiro de empresários de Ourinhos, Marília, Assis e Agudos. Além do golpista que se passava por prefeito, mais três pessoas que faziam parte do esquema foram presas em Bauru e Agudos. Os quatro tiveram a prisão temporária decretada pela Justiça e foram encaminhados para Penitenciária de Pirajuí e vão responder pelo crime de estelionato.
Continuando essa avaliação dos fatos, chama à
atenção, em primeiro lugar, a forma dos contatos iniciais com as futuras
vítimas. O suspeito, ao se apresentar como prefeito mostrava interesse em
contratar as empresas para obras públicas e já sinalizava com a necessidade de
alguns “adiantamentos” para reformas na “sua jurisdição”.
Em segundo lugar, a escolha das vítimas, onde
eram selecionadas empresas prestadoras de serviços a outras prefeituras, o que
aparentemente os suspeitos consideravam com maior probabilidade de “novas
oportunidades” serem bem acolhidas.
Como último ponto desta análise, a quantidade
de golpes com “sucesso” não foi, aparentemente, muito pequena e a extensa
delimitação geográfica de atuação do grupo (os estados de São Paulo, Minas
Gerais e Paraná). Esses três estados já foram mapeados, mas podem surgir
vítimas de outras regiões no decorrer do processo.
Com todos os fatos considerados, pode-se
pensar – com preocupação – sobre a maneira das empresas acostumadas a negociar
com prefeituras, no caso as escolhidas pelos suspeitos, “abraçarem” as causas
do “pseudoprefeito” como uma prática
natural para todos os envolvidos. A equipe das “falsas prefeituras” foi desbaratada (pelo menos até que alguma
liminar os coloque novamente na ativa), mas a grande questão é se as “prefeituras
de grandes cidades”, conforme
aparece na notícia do G1, não mereceriam algum tipo de atenção investigativa a
partir do comportamento natural das empresas com essa espécie de propina. Não
parece estranho?
Com tanta possibilidade de possíveis ilícitos,
a Tertúlia de hoje traz a poesia “Contrabando”, do saudoso poeta e
escritor gaúcho Apparício Silva Rillo, onde Nico, um antigo contrabandista –
talvez menos perigoso que alguns dos envolvidos nas situações que apareceram
acima –, teve um final dramático.
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CONTRABANDO
Apparício Silva Rillo
Vai
a barca de farinha
cruzando o velho Uruguai.
Vaqueano dessas cruzadas
vem na popa um índio moço
manejando o varejão.
Vem atento e vem pensando:
Vou deixar do contrabando,
não é vida pra um cristão.
Hoje eu vim porque o menino
deu sumiço na chupeta
e aquele piá trompeta
saiu louco de chorão...
Sorri o moço da popa
porque no bolso da roupa
traz o bico pro piá.
Ouve um tiro, de repente,
vindo da banda de lá!
Foi tiro de sinal.
Já no mais o tiroteio
se acendeu no macegal,
pipocando seco e feio
como entrechoque de guampas
no entrevero do rodeio
no dia em que se dá sal.
Mala suerte!
O barco vinha chegando,
e a carga do contrabando
com mais dez braças de rio,
tinha subido a picada,
da picada pra carreta,
e dai pro caminhão.
Ouve um grito de: – Lá fresca,
o Nico se lastimou!
Mas ninguém botou tenência
no sentido deste grito,
porque a coisa vinha preta
sob o tendal de balaços
que a guarda ajena estendeu.
Cada bala que cruzava
debochava de assobio!
Quando o barco deu no porto
no lado de cá do rio,
o pessoal ganhou o mato,
na picada se sumiu.
O barco ficou sozinho
na madrugada e no rio.
Digo mal: ficou o Nico
sobre um saco de farinha
que um balaço espedaçou.
Tinha um lenço maragato
na brancura da farinha
onde o índio se apoiou.
Foi quando a manhã surgiu,
mostrando o sangue do Nico
pingando dentro do rio...
Menino, cala esta boca,
não demora chega o Nico,
vai-te trazer outro bico
que é pra tu não chorar mais.
Veio a manhã, veio a tarde,
veio a boieira luzir.
Veio a noite grande e morta,
A china veio pra porta,
E nada do Nico vir!
Veio um dia,
mais um dia,
veio outro dia depois.
Ao pé de uma lamparina
vela em silêncio uma china
que de chorar se cansou.
Numa cama de pelego
choraminga sem sossego
um piazito babão.
Choraminga! Choraminga!
...porque o pai não trouxe o bico,
e o que tinha se extraviou...
cruzando o velho Uruguai.
Vaqueano dessas cruzadas
vem na popa um índio moço
manejando o varejão.
Vem atento e vem pensando:
Vou deixar do contrabando,
não é vida pra um cristão.
Hoje eu vim porque o menino
deu sumiço na chupeta
e aquele piá trompeta
saiu louco de chorão...
Sorri o moço da popa
porque no bolso da roupa
traz o bico pro piá.
Ouve um tiro, de repente,
vindo da banda de lá!
Foi tiro de sinal.
Já no mais o tiroteio
se acendeu no macegal,
pipocando seco e feio
como entrechoque de guampas
no entrevero do rodeio
no dia em que se dá sal.
Mala suerte!
O barco vinha chegando,
e a carga do contrabando
com mais dez braças de rio,
tinha subido a picada,
da picada pra carreta,
e dai pro caminhão.
Ouve um grito de: – Lá fresca,
o Nico se lastimou!
Mas ninguém botou tenência
no sentido deste grito,
porque a coisa vinha preta
sob o tendal de balaços
que a guarda ajena estendeu.
Cada bala que cruzava
debochava de assobio!
Quando o barco deu no porto
no lado de cá do rio,
o pessoal ganhou o mato,
na picada se sumiu.
O barco ficou sozinho
na madrugada e no rio.
Digo mal: ficou o Nico
sobre um saco de farinha
que um balaço espedaçou.
Tinha um lenço maragato
na brancura da farinha
onde o índio se apoiou.
Foi quando a manhã surgiu,
mostrando o sangue do Nico
pingando dentro do rio...
Menino, cala esta boca,
não demora chega o Nico,
vai-te trazer outro bico
que é pra tu não chorar mais.
Veio a manhã, veio a tarde,
veio a boieira luzir.
Veio a noite grande e morta,
A china veio pra porta,
E nada do Nico vir!
Veio um dia,
mais um dia,
veio outro dia depois.
Ao pé de uma lamparina
vela em silêncio uma china
que de chorar se cansou.
Numa cama de pelego
choraminga sem sossego
um piazito babão.
Choraminga! Choraminga!
...porque o pai não trouxe o bico,
e o que tinha se extraviou...
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Para encerrar esta Tertúlia Nativa, do saudoso poeta e compositor Luiz Menezes, com Dante Ramon Ledesma - cantor nascido na Argentina e naturalizado brasileiro desde 1978 -, "Milonga do Contrabando".
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