A saúde depende mais das precauções que dos médicos.
(Jacques Bénigne Bossuet)
Amigas e Amigos,
Ouvindo
o canto dos pássaros que vem do quintal de minha casa e tomando um chimarrão na
varanda, na expectativa de uma chuva que parece já cair nas proximidades de
Brasília, li o jornal “Zero Hora”, no portal do ClicRBS e chamou minha atenção
a manchete sobre falta de médicos que, com o alto número de morte de bebês,
provocou o fechamento da UTI Neonatal de Canguçu-RS.
Além do
fato, normalmente associado ao descaso de nossos governos com saúde pública, o
meu interesse na matéria foi provocado pela lembrança de que nos distantes anos
de 1974/75 tive oportunidade de trabalhar nessa cidade do interior do Rio
Grande do Sul.
Bem
mais preocupante que a manchete é o conteúdo da matéria, de onde separei uma
parte, conforme abaixo:
Canguçu, município com 53 mil habitantes na Metade Sul do Estado, está em choque. A UTI Neonatal do Hospital de Caridade do município — um sonho acalentado há anos pela comunidade — foi fechada após apenas três meses de funcionamento pela Secretaria Estadual de Saúde (SES). As razões: falta de médicos suficientes para manter a unidade criada para ser referência regional e uma mortalidade de bebês bem acima do usual. Nos 90 dias de funcionamento, morreram no local 12 bebês dos 45 atendidos. Conforme a Secretaria Estadual de Saúde (SES), a proporção na casa de saúde de Canguçu foi de 80 óbitos para cada mil nascimentos no hospital, no primeiro mês de vida. A média nas UTIs neonatais gaúchas, segundo a secretaria, é de 13 mortes para cada mil nascimentos. […] A unidade de Canguçu começou a funcionar com apenas dois médicos e, depois de algum tempo, contava com quatro — quando o número exigido pela Anvisa seria oito médicos para cuidar de 10 pacientes (a capacidade da unidade). Ciro Simoni relata que, para obter a autorização para o funcionamento da unidade, o hospital mostrou contratos firmados com uma empresa que empregaria os médicos na instituição […] A comoção causada em Canguçu gerou uma sessão especial da Câmara de Vereadores, promovida pelo vereador Ubiratan Rodrigues (PP), e um inquérito aberto pelo Ministério Público Estadual para investigar as mortes. Quem conduz o procedimento éa promotora Camile Balzano de Mattos, que ontem recebeu o levantamento fotógrafico da UTI. Estão sob análise as condições médico-sanitárias, higiene, espaço físico, material e equipamentos utilizados, tecnologia para diagnóstico e tratamento, além da performance da equipe de assistência médica e enfermagem e sua qualificação. Apesar das investigações, o secretário Ciro Simoni não tem dúvidas de que a unidade Neonatal será reaberta...
Sempre
que vejo esses reflexos da negligência de nossa amodorística administração
pública, fico imaginando se ainda está muito distante o tempo em que descasos
como esse exigirão respostas contundentes dos responsáveis por tantos
desmandos.
Não é
concebível que uma unidade de saúde que necessita de, no mínimo, 8 médicos
(conforme determinação da Anvisa), comece a funcionar com apenas 2. Nas
desculpas preparadas para o “jogo de empurra” de responsabilidades, já foi
informado que havia contratos firmados com uma empresa para empregar os médicos
e que só por isso foi emitida a autorização de funcionamento.
A
existência desse citado contrato leva a imaginar que a empresa responsável por
ele já tenha sido acionada judicialmente por descumprimento do mesmo. Sobre
isso, não há qualquer comentário. Pode ser que o contrato não estivesse bem
redigido o que implicaria em facilidades para a empresa não atendê-lo. Nesse
caso, os responsáveis pela redação, aprovação e assinatura, bem como os que o
validaram nas instâncias superiores, já deveriam estar respondendo a processos
administrativos. Mas sobre isso, também não vi qualquer referência.
Como
sempre acontece nesses casos, não faltam políticos e advogados para buscarem
alguma “promoção” pessoal em cima dos efeitos sem grande preocupação com as
causas. Apesar de tudo isso, o secretário estadual de Saúde não tem dúvidas de
que a unidade Neonatal de Canguçu será reaberta. Faltou dizer, apenas, em que
condições.
Essas condições não tem qualquer
relação com as condições do prédio que abriga a unidade, pois ela está
localizada em um tradicional hospital, mas com a forma como será conduzida a
contratação de médicos.
Vale lembrar que essa unidade Neonatal ficou parada – depois
de concluída as obras no hospital – por 9 meses. Foi inaugurada, as pressas,
após um drama protagonizado por uma funcionária pública de Santa Vitória do
Palmar-RS que precisou fazer uma viagem de 500 km para dar à luz filhos gêmeos.
Esse episódio, em outubro de 2011, mostrou claramente a deficiência de leitos
no Estado e acabou com um entrave burocrático de 9 meses, provavelmente, de
forma precipitada – talvez, até com “dedos cruzados” para que nada desse errado.
Mas deu, e aí o que se vê são como replays de filmes tantas vezes exibidos.
A música escolhida para encerrar esta semana,
desejando que o hospitaleiro povo de Canguçu logo veja superada essa confusão da área de Saúde,
é “Leito de Hospital”, de Léo Canhoto e Sebastião Victor, com Tião Carreiro
& Pardinho.
Até a próxima e um grande abraço para todos!
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